Capítulo 5


                                           ESTATÍSTICAS DA JUVENTUDE


5.1 – Estatísticas dos jovens no Brasil

            Com a finalidade de trabalharmos esse tema, encontramos um conjunto de informações a partir do “Texto para Discussão” do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, com o tema: JUVENTUDE E POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL, organizado por Jorge Abrahão de Castro e Luseni Aquino, publicado em Brasília, abril de 2008.
O IPEA é uma Fundação pública vinculada ao Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, fornece suporte técnico e institucional às ações governamentais – possibilitando a formulação de inúmeras políticas públicas e programas de desenvolvimento brasileiro – e disponibiliza, para a sociedade, pesquisas e estudos realizados por seus técnicos.

5.1.1 – A juventude e suas questões

Dados da Projeção Populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE – revisão 2004) apontam que, em 2006, os jovens brasileiros com idade entre 15 e 29 anos somavam 51,1 milhões de pessoas, o que então correspondia a 27,4% da população total. Este contingente é 48,5% maior do que aquele de 1980, quando havia no país 34,4 milhões de jovens; no entanto, ainda é menor do que os 51,3 milhões projetados para 2010.
As projeções indicam, no entanto, que a partir daí a tendência de crescimento da população jovem deverá se reverter, havendo uma redução progressiva no número absoluto de jovens no Brasil, que chegará a 2050 em torno de 49,5 milhões (gráfico 1).



O peso numérico desse segmento na atualidade, bem como o fato de que suas condições sociais presentes deverão ter impacto sobre a fase seguinte da transição, justificam um olhar especial sobre as questões que afetam e mobilizam os jovens brasileiros hoje.
A pesquisa de opinião “Perfil da Juventude Brasileira – 2003” deixou evidente que, para eles, os aspectos positivos de ser jovem sobrepujam em muito os negativos: 74% dos informantes declararam que há mais coisas boas em ser jovem do que ruins, contra 11% que declararam o contrário e 14% que optaram pelas duas possibilidades simultaneamente. Por um lado, entre as coisas boas de ser jovem destacaram-se aspectos tão variados quanto não ter responsabilidades, poder aproveitar a vida, ter liberdade, fazer amizades, ter saúde e disposição física, mas também poder estudar e adquirir conhecimentos e poder trabalhar.

Sintomaticamente, quando inquiridos sobre os assuntos que mais lhes interessavam, três temas predominaram: educação, trabalho e oportunidades de cultura e lazer. Embora os pesos relativos se diferenciem conforme a idade, a escolaridade e o nível de renda familiar, é interessante notar que este resultado geral espelha, em larga medida, as expectativas sociais sobre essa etapa do ciclo da vida, estando todos os aspectos relacionados à liberalidade outorgada ao jovem para o seu pleno desenvolvimento pessoal e social – até mesmo a possibilidade de trabalhar, se entendida como experimentação da inserção no mundo de trabalho e desenvolvimento de capacidades.
De outro lado, entre as coisas ruins de ser jovem destacaram-se na opinião dos entrevistados o convívio com riscos variados (drogas, violência, más companhias) e a falta de trabalho e renda, além da falta de liberdade expressa pelo controle familiar. Mais uma vez, chama atenção a correspondência entre a percepção dos jovens e da sociedade em geral acerca desta etapa do ciclo de vida: os “problemas” habitualmente correlacionados aos jovens pela opinião pública foram exatamente aqueles citados pelos próprios jovens como os principais aspectos negativos da condição juvenil. Isto fica ainda mais evidente quando se trata das maiores preocupações dos jovens atualmente, entre as quais foram explicitamente citadas, na ordem, as questões que os atingem mais de perto, a saber: segurança/violência, o trabalho (emprego/questões profissionais) e as drogas.
Esse quadro de percepções dos próprios jovens sobre a sua realidade referenda a importância que as questões ligadas à juventude brasileira ganharam no período recente, tornando-se objeto de grande interesse social. Nesse sentido, cabe discorrer mais detalhadamente sobre essas questões, enfocando os desafios que apresentam para as políticas públicas brasileiras.


5.1.2 A convivência com “riscos”

O tema “risco” é eminentemente juvenil. Aos jovens costuma-se associar a inconseqüência, a paixão pelas emoções fortes, os excessos impulsivos, a vulnerabilidade psicoemocional ou a disposição ao individualismo narcísico que ensejariam “comportamentos de risco”. Algo desta percepção certamente se deve ao teor conservador (no sentido de preservador) da retórica da estabilidade e da responsabilidade do mundo adulto.
Outra parte, no entanto, está referida à própria condição juvenil e à imprevisibilidade contida na passagem de uma experiência de vida majoritariamente pautada pelas relações que se estabelecem no espaço protegido e controlado da convivência familiar para as múltiplas vivências possíveis no cenário mais amplo dos espaços públicos, nos quais tem lugar a efetiva construção da autonomia.
É interessante observar que os próprios jovens percebem a convivência com “riscos” enquanto um aspecto inerente à condição juvenil, tendo sido este o principal aspecto negativo de ser jovem identificado pela pesquisa “Perfil da Juventude Brasileira – 2003” supracitada. Mas o que seriam estes “riscos”? Segundo a opinião dos jovens, as principais questões associadas a essa noção são as drogas, a violência e as “más companhias”, sendo os riscos iminentes as possibilidades de dependência química, de vitimização por agressões ou de envolvimento em situações perigosas por influência do grupo de amigos. É possível incluir ainda a iniciação sexual precoce e práticas sexuais desprotegidas, pela possibilidade tanto de infecção por doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) quanto da gravidez na adolescência.
Recentemente, a evasão escolar e a ociosidade (não freqüentar a escola e não trabalhar) passaram a integrar os “riscos” que circundam os jovens, o que, pelas potenciais conseqüências em termos da qualificação e produtividade da força de trabalho, extrapola a ameaça de danos do nível meramente individual para o social.
Tomando-se o “risco” estritamente como uma ameaça à integridade e ao desenvolvimento do indivíduo, com repercussões diretas sobre si mesmo e sobre a sociedade, alguns dados podem explicar a relevância que o tema adquiriu na atualidade.
No Brasil, a violência ocasiona uma sobremortalidade nos adolescentes e adultos jovens do sexo masculino, fazendo com que, do ponto de vista sanitário, o período etário de 15 a 29 anos seja considerado de alto risco, quando poderia ser um dos mais saudáveis do ciclo vital. No que se refere à infecção por doenças sexualmente transmissíveis, é importante notar que os casos notificados de aids na população de 15 a 29 anos correspondem a 30% do total (112 mil casos, desde o início dos anos de 1980 até 2005). Quanto ao abuso das drogas, é relevante o fato de que o grupo com idade de 18 a 24 anos é aquele em que se registram as maiores porcentagens de dependentes de álcool: 19,2% contra 12,3% observados para o total de todas as idades (a partir dos 12 anos), sendo que os jovens dependentes do sexo masculino prevalecem com grande vantagem sobre os do sexo feminino (27,4% contra 12,1%) e sobre o conjunto dos homens de todos os grupos etários (27,4% contra 19,5%).
É comum associar o envolvimento ou exposição a esses tipos de “risco” a fatores tão variados quanto baixa auto-estima, sentimento de inadequação aos espaços de convivência, vivência de abuso físico, sexual ou psicológico por membros da família, constrangimento imposto pela condição socioeconômica, de gênero ou raça etc. Em linhas gerais, estes fatores expressam dificuldades na relação do jovem com seu meio mais imediato, podendo ser organizados em três categorias distintas: i) problemas na vinculação social do jovem às instituições que têm como função contribuir para a sua formação e supervisão (a família, a comunidade, a escola); ii) condições em que se dá o processo de construção de sua auto-imagem; e iii) influência do grupo de amigos com que convive mais imediatamente o jovem e as inter-relações que este grupo estabelece na sociedade. Certamente o engajamento “voluntário” em condutas que envolvem algum tipo de perigo previsível está relacionado a aspectos complexos da conjugação destes e possivelmente de outros fatores (como a fragilização das instituições sociais tradicionais ou a manifestação da chamada personalidade anti-social, por exemplo), mas o peso relativo de cada um deles, bem como sua forma de manifestação mais imediata, varia caso a caso, segundo a situação individual de cada jovem em sua singularidade.
Entretanto, ao se abordar a questão do “comportamento de risco” para além de suas manifestações individuais e como aspecto associado à condição juvenil, é preciso atentar para um fator fundamental: nessa fase da vida ocorrem as primeiras experiências de decisão autônoma e afirmação da liberdade em um contexto de experimentação exploratória do mundo. Estas experiências – que carregam uma demanda implícita do jovem por assumir responsabilidades – envolvem sempre certo “risco”, que pode estar associado tanto aos “erros de julgamento” quanto aos “testes de confiabilidade” da rede de proteção disponível.
De um lado, o que se revela como comportamento de risco, muitas vezes pode ser a expressão do resultado não antecipado das decisões de quem está aprendendo a tomá-las premido pela urgência de mostrar o próprio valor a si mesmo e aos outros. Considerando-se que, do ponto de vista dos jovens, eles teriam “pouco a perder”, já que não estão plenamente integrados aos vínculos das instituições sociais e que a morte é uma possibilidade distante, inverossímil, é possível conceber que eles simplesmente se disponham a brincar com o controle da própria vida, correndo “riscos” ao desprezar a interdependência entre a própria ação e a de terceiros no estabelecimento de um determinado objetivo.
Ao mesmo tempo, tomar decisões autônomas requer confiança nas condições de sua implementação. À medida que aprofunda a inserção social do jovem nos âmbitos de circulação e atuação dos adultos, ele se vê impelido a certificar-se da validade e solidez das instituições, das normas e dos valores sociais com os quais passa a lidar de maneira cada vez mais freqüente. Nesse outro sentido, o que em muitas ocasiões é percebido como mera transgressão juvenil pode ser, na verdade, expressão de um teste da rede de proteção. Este teste, que conjuga a dimensão do perigo e da segurança e por vezes resulta em danos pessoais ou a terceiros, tem importância crucial para quem está construindo, experimentando e buscando afirmar uma nova identidade.
Em última instância, serve para responder a uma pergunta essencial: se for preciso, será realmente possível contar com alguém/algo? Tal pergunta é especialmente coerente
com o contexto atual de produção social de insegurança, desencadeado pelo fracasso dos diversos mecanismos de integração social, inclusive as relações intergeracionais.
Ademais, diante da juvenilização da sociedade e da conversão do jovem em modelo cultural, fica a seguinte questão: se todos são “jovens”, que referências de adulto restam
ao jovem, com as quais se confrontar e perante as quais se afirmar? Enfrentar essas questões e minimizar os seus efeitos para os jovens brasileiros requer levar a sério as dificuldades e as demandas desses jovens, e não adotar uma perspectiva catastrofista sobre a condição juvenil. Sob este aspecto, a reflexão sobre o tema dos “riscos” deve considerar as dificuldades e as estratégias de que os jovens lançam mão na trajetória que lhes dará acesso ao mundo adulto, de modo que as ações que visam à prevenção de danos façam algum sentido para os próprios jovens e sejam realmente efetivas.


5.1.3 Juventude e escola: trajetórias irregulares e fracasso

Embora persista a identificação social do jovem como “estudante” e a escola seja amplamente reconhecida como espaço privilegiado de socialização e formação, o processo de escolarização da maioria dos jovens brasileiros é marcado por desigualdades e oportunidades limitadas. Predominam trajetórias escolares interrompidas pela desistência e pelo abandono, que, algumas vezes, são seguidos por retomadas. As saídas e os retornos caracterizam um percurso educacional irregular. Assim, a defasagem escolar acaba se transformando na realidade de muitos.
A freqüência ao ensino médio na idade adequada ainda não abrange metade dos jovens brasileiros de 15 a 17 anos, e cerca de 34% deles ainda estão retidos no ensino fundamental. O acesso ao ensino superior é ainda mais restrito, com apenas 12,7% dos jovens de 18 a 24 anos freqüentando esse nível de ensino. A proporção de jovens fora da escola, por sua vez, é crescente conforme a faixa etária: 17% na faixa de 15 a 17 anos, 66% na de 18 a 24 anos, e 83% na faixa de 25 a 29 anos, sendo que muitos destes jovens desistiram de estudar sem ter completado sequer o ensino fundamental.
Tal situação é ainda mais grave no caso da expressiva proporção de jovens de 18 a 29 anos nessa condição, pois o incentivo para o retorno à escola para completar o ensino obrigatório tende a ser menor do que entre os que ainda estão na faixa de 15 a 17 anos. Contudo, é significativo o fato de que, vencida a barreira do ensino fundamental, boa parcela dos que têm mais de 18 anos conseguiu completar o ensino médio (cerca de 30%), embora sem buscar a continuidade de estudos no ensino superior.
Dados da pesquisa “Juventudes Brasileiras” revelam que muitos dos jovens que não mais estudam pararam de estudar uma vez (61,6%), duas vezes (20,1%) e três vezes ou mais (16,7%). A pesquisa também captou que, entre os homens, a principal razão de abandonar os estudos foi a oportunidade de emprego (42,2%), enquanto entre as mulheres foi a gravidez (21,1%). Em que pesem as enormes dificuldades, onde o estigma do fracasso é acompanhado da auto-responsabilização pelos resultados, a grande maioria dos jovens que está fora da escola (69,5%) acredita que terá condições de voltar a estudar. E são muitos os que retornam por atribuírem valor à educação como um caminho para “melhorar de vida”. O persistente retorno dos jovens à escola deve ser visto como uma oportunidade de se repensar o sistema educacional de forma a assegurar um aprendizado que tanto estimule quanto assegure a trajetória de sucesso escolar.
Entretanto, a universalização do acesso em um sistema educacional que não foi estruturado para lidar com a diversidade dos alunos gerou uma escola que acaba transformando desigualdades sociais em desigualdades de resultados escolares. É uma situação que revela “indiferença pelas diferenças”, na qual a seleção não se dá mais no acesso, mas no interior da escola, confluindo para um desempenho marcado pelo fracasso escolar. Os elevados índices de repetência e evasão que acompanham a trajetória de muitos jovens colocam um dos maiores desafios para o sistema educacional brasileiro: como assegurar educação básica para todos, em um percurso educacional completo?
Nesse contexto, a busca da escola noturna é a realidade de muitos jovens que trabalham. Mas não é só a situação de trabalhador que leva os jovens à escola noturna. O atraso no percurso escolar também é responsável pela procura do ensino noturno, contexto em que a escola cumpre o papel de espaço de sociabilidade e de troca de experiências entre os jovens que a freqüentam. Assim, especialistas afirmam que, em muitos casos, o trabalho vem como conseqüência da freqüência à escola noturna. Paralelamente, a oferta de curso noturno regular, seja fundamental ou médio, tem sido uma forma de os sistemas de ensino responderem às pressões de demanda, sem investimentos mais significativos na ampliação da rede. Se críticas à qualidade do ensino da escola pública são recorrentes, o que se dirá da qualidade dos cursos noturnos?
As diferenças nas características pedagógicas dos cursos diurno e noturno exigiriam uma proposta curricular diferenciada, mas não é isso o que se verifica. Na prática, o que acontece é uma replicação de currículos elaborados para um aluno teórico, um aluno médio que não existe, desconsiderando todas as orientações dos projetos pedagógicos, cujas práticas educativas deveriam ser pautadas na realidade social do aluno. E o aluno que estuda de noite geralmente trabalha durante o dia, não tem tempo nem o hábito de estudar; chega cansado à escola e precisa que o ensino seja mais atrativo e conectado à realidade do mundo do trabalho que vivencia. Investigação realizada em uma escola noturna revela que os professores admitem que o ensino necessita ter aplicabilidade, enquanto os alunos sabem que precisam adquirir mais conhecimentos teórico e prático, em vez do ensino resumido e aprendizagem facilitada que muitas escolas noturnas oferecem.
O direito e a democratização do acesso à educação básica de qualidade exigem atenção especial à escola noturna, freqüentada por muitos jovens trabalhadores na busca de ampliar seus conhecimentos para melhor se inserirem no mercado de trabalho.
É preciso reconhecer que muitas das dificuldades enfrentadas pelos jovens, quando chegam ao ensino médio, decorrem de deficiências de aprendizado no ensino fundamental, o qual vem falhando até mesmo em seus propósitos elementares de ensinar a ler, escrever e fazer contas.
Não resta dúvida de que melhorar a qualidade da educação básica, em seus componentes fundamental e médio, deve ser a meta principal da política educacional. Ao ensino médio, em sua maior complexidade, atribui-se o desafio de cumprir múltiplas finalidades: educar para a vida, educar para o mundo do trabalho e assegurar conhecimentos para a continuidade dos estudos. Este desafio ainda requer respostas de reformas educacionais que prometem, mas que na realidade não acontecem. Iniciativas recentes de integração de ensino médio e técnico nas escolas regulares apontam para novos caminhos que ainda precisam ser avaliados em seus resultados. Entretanto, é uma busca de alternativa em um contexto em que muitos jovens, desestimulados pelo ensino nas escolas que freqüentam, estão abandonando o ensino médio, particularmente o noturno.

5.1.4 A difícil inserção no mercado de trabalho

O ingresso dos jovens no mundo do trabalho é um dos temas centrais quando se discute a juventude como questão social na atualidade. Nesse sentido, é o tema que, ao lado de saúde e educação, mais freqüentemente pautou as ações públicas voltadas para a juventude, no Brasil e no mundo. Se este problema foi formulado nos países capitalistas centrais em termos da necessidade de garantir uma passagem bem-sucedida entre escola e mundo do trabalho em um contexto de desemprego crescente, no caso brasileiro, a questão mais premente foi sempre a do trabalho precoce, que antecede a saída da escola – sem qualquer garantia de que esta saída ocorra após a conclusão do nível básico de ensino – e que tende a dificultar a continuidade dos estudos, bloqueando as oportunidades futuras.
A este problema veio somar-se o da crise do emprego, que atinge a população jovem de forma especialmente acentuada, tanto pelo desemprego quanto pela ocupação em postos de trabalho precários. Apesar de o ingresso precoce de jovens ser uma característica marcante do mercado de trabalho brasileiro, existe uma clara tendência de arrefecimento do fenômeno. Isto pode ser demonstrado pela comparação das taxas de participação por idade de coortes diferentes. Enquanto mais de 28% dos trabalhadores nascidos entre 1970 e 1979 já estavam no mercado de trabalho aos 13 anos, com apenas 14% dos trabalhadores nascidos após 1990 ocorria o mesmo. De modo geral, para as coortes mais recentes, há menor taxa de participação para seus membros mais jovens; isto é, entre os nascidos na década de 1990, a taxa de participação para idades inferiores a 16 anos é menor que para os nascidos na década de 1980, que por sua vez é menor que a dos nascidos na década de 1970. Ou seja, nas coortes mais recentes, os jovens com idade inferior a 16 anos têm protelado sua entrada no mercado de trabalho, embora ainda exista uma taxa de participação alta para grupos que, legalmente, não deveriam estar no mercado de trabalho (em 2006 a taxa de atividade para pessoas entre 10 e 14 anos foi de 10,8%)32 e para o grupo que, supondo o fluxo escolar regular, deveria estar cursando o ensino médio (para as pessoas de 15 a 17 anos, a taxa de participação foi de 39,3% em 2006). Considerando-se todas as pessoas com idade entre 15 e 29 anos, observa-se grande diversidade no que diz respeito à qualidade dos postos de trabalho que os jovens ocupam. Em geral, para os grupos mais jovens, os postos ocupados são os com menores exigências de qualificação e de pior qualidade, o que se reflete no fato de que apenas 11% dos jovens de 15 a 17 anos ocupados eram empregados com carteira assinada, evidenciando-se a barreira imposta pelas baixas qualificação e experiência características do grupo. Passando-se para os grupos etários seguintes, verifica-se um aumento da proporção de trabalhadores em melhores ocupações, o que, além do efeito “escalada” das ocupações piores para as melhores, reflete ainda a mudança na composição desses grupos: entre os jovens de 18 a 29 anos estão não apenas aqueles que entraram cedo no mercado de trabalho e conseguiram, paulatinamente, mudar para ocupações melhores; encontram-se aí também os jovens que puderam protelar sua entrada no mercado de trabalho – possivelmente aumentando sua escolaridade no processo – e que já conseguem um posto de melhor qualidade como primeira ocupação.
Entretanto, mesmo nesses grupos, observam-se altas proporções de jovens nas ocupações de pior qualidade: quase a metade do grupo de 18 a 24 anos e cerca de 30% do grupo de 25 a 29 eram empregados sem carteira ou trabalhadores não-remunerados.
Este quadro revela que um grande contingente dos jovens brasileiros que trabalham não tem acesso a garantias sociais e trabalhistas, o que pode ter impacto na condição e no exercício da cidadania durante a sua vida laboral. Sobre o problema do desemprego, sabe-se que, universalmente, ele tende a ser mais acentuado entre os jovens que entram no mercado de trabalho do que entre o restante da população. No Brasil, a situação não é diferente. Os jovens – especialmente os grupos entre 15 e 24 anos – apresentam taxas de desemprego substancialmente maiores que as dos trabalhadores adultos; em 2006, enquanto a taxa de desemprego era de 5% entre os adultos de 30 a 59 anos, observavam-se índices de 22,6% entre os jovens de 15 a 17 anos, 16,7% entre 18 e 24 anos, e 9,5% entre 25 e 29 anos. Não se nota, além disso, nenhuma tendência de aproximação entre as taxas de desemprego de jovens e não-jovens; ao contrário, a taxa de desemprego dos jovens cresce proporcionalmente mais.
Esses fenômenos ocorrem por motivos diversos, alguns dos quais identificados como problemas e, portanto, alvo de ação pública, e outros que não são necessariamente problemas. Por exemplo, é notório que há maior rotatividade entre os trabalhadores jovens do que entre os demais, e que esta rotatividade maior implica uma taxa de desemprego também maior. Parte da rotatividade, que não é necessariamente prejudicial à trajetória profissional, deve-se às próprias decisões do trabalhador jovem que, no início do ciclo de vida, passa por um processo de “experimentação” em várias ocupações, com o espectro de possibilidades aumentando conforme aumentam sua
experiência e qualificação. Ao mesmo tempo, outro fator da rotatividade deste grupo de trabalhadores é explicado pelo lado da demanda: os postos de trabalho ocupados por pessoas com pouca qualificação e experiência são, geralmente, os piores em termos de remuneração e condições de trabalho, além de terem os custos mais baixos de demissão e contratação. Avaliar a gravidade do desemprego juvenil exige, então, identificar qual é o principal fator envolvido. Deve-se também avaliar se o desemprego é concentrado em algum grupo específico de jovens (sobre os com maior defasagem escolar, por exemplo), uma vez que, se este for o caso, a situação só vai se alterar por meio de ação da política pública.
No que tange à inatividade entre os jovens, há dois vetores de análise possíveis. Por um lado, se associada à extensão do tempo de estudo, é usualmente considerada um aspecto positivo da condição juvenil, pelo que possibilita em termos de aquisição de conhecimentos para o trabalho e para a vida cidadã. Por outro lado, quando sua ocorrência está ligada ao desemprego por desalento ou à ocupação em atividades domésticas, especialmente se coincidir com o abandono dos estudos, é preocupante. A tabela 1 indica que uma minoria de jovens consegue permanecer como estudante apenas após os 17 anos (idade regular para a conclusão do ensino médio). Se mesmo antes desta idade uma parcela expressiva dos jovens precisa conciliar a freqüência escolar com o trabalho, a partir dos 18 anos predomina crescentemente a condição de trabalhador (especialmente, mas não exclusivamente, para os jovens do sexo masculino), seguido do contingente dos jovens que não estudam e não trabalham (no qual predominam as mulheres, em geral refletindo a realização de trabalho doméstico – seja na condição de filha, seja na condição de cônjuge). O aspecto mais problemático é que grande parte desses jovens não havia completado a educação básica quando parou de estudar, e só uma parcela pequena conseguirá fazê-lo após ingressar no mundo do trabalho.



O quadro de indicadores aqui analisado revela o quão restritas têm sido as oportunidades disponíveis aos jovens brasileiros no mercado de trabalho. Na verdade, se a “crise do emprego” que se manifestou no Brasil em meados da década passada atingiu toda a população trabalhadora, os jovens foram particularmente prejudicados. Altas taxas de desemprego, ocupações precárias e baixos salários têm comprometido seriamente sua trajetória educacional e profissional. Além disso, refletem diretamente nas garantias sociais, trabalhistas, na condição e no exercício da cidadania, tendo em vista que o vínculo com a rede pública de proteção social ainda se dá em grande medida via inserção no mercado formal de trabalho. Nesse sentido, a “crise do emprego” evidencia os limites impostos pela adoção do trabalho (formal) como mecanismo central de inserção social dos indivíduos, inclusive para efeito das políticas públicas de proteção social. Na atualidade, são muitas as estratégias de sobrevivência que, mobilizando em especial os jovens, escapam à definição clássica de trabalho (concebido como emprego ou posto de trabalho assalariado) e possibilitam formas de inserção alternativas no mundo do trabalho e na vida social mais ampla. Desse modo, reconhecer essa realidade e fomentar seu potencial inclusivo, até mesmo apoiando a sua capacidade de gerar e distribuir renda e proteção social, pode ser uma tarefa premente para as políticas públicas de inclusão dos jovens.

5.1.5 - Vitimização pela violência e criminalidade juvenil

A violência que acerca os jovens tem sido motivo de preocupação crescente no país. Por um lado, a vitimização fatal de jovens é alarmante. As estatísticas mostram que, enquanto as taxas de mortalidade da população brasileira como um todo vêm decrescendo progressivamente – como tendência de longo prazo relacionada à melhoria das condições de vida –, tal fenômeno não se observa com intensidade semelhante no caso do grupo populacional com idade entre 15 e 29 anos. A principal explicação está associada às altas taxas de mortalidade nessa faixa etária por causas externas, que englobam diversas formas de acidentes e violências, entre as quais os assassinatos por armas de fogo e os acidentes de trânsito. As vítimas, em geral, são jovens do sexo masculino, pobres e não-brancos, com poucos anos de escolaridade, que vivem nas áreas mais carentes das grandes cidades brasileiras.
Segundo dados do Sistema de Informações de Mortalidade do Sistema Único de Saúde (SIM/SUS), as mortes por homicídios entre os brasileiros de 15 a 29 anos passaram da média anual de 27.496 no período 1999-2001 para 28.273 no período 2003-2005, sendo responsáveis por 37,8% de todas as mortes nesta faixa etária. Note-se que estas mortes vitimam mais os homens (cerca de 93% da vítimas de homicídios),  concentrando-se no grupo de 18 a 24 anos (com taxa de 119,09 vítimas por 100 mil habitantes), seguido do grupo de 25 a 29 anos (107,44) e do de 15 a 17 anos (64,59). No que se refere aos acidentes de trânsito – responsáveis pelo segundo maior número de mortes entre os jovens brasileiros –, os dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) informam que, em 2006, os jovens com idade entre 18 e 29 anos representaram 26,5% das vítimas fatais (contra 40,9% para o grupo de 30 a 59 anos) e 36,9% das vítimas não fatais (contra 32,4% para o grupo de 30 e 59 anos) de acidentes de trânsito no país.
No que se refere à violência não-letal, os jovens também são as maiores vítimas. Um levantamento realizado pelo Ministério da Justiça (MJ) com as ocorrências registradas pelas polícias civis dos estados indica que, em 2005, o grupo de 18 a 24 anos foi a maior vítima não apenas dos casos de homicídio doloso (47,41 ocorrências por 100 mil habitantes), mas também das lesões corporais dolosas (514,83), das tentativas de homicídio (38,06), da extorsão mediante seqüestro (0,78) e do roubo a transeunte (333,8); já os jovens de 25 e 29 anos apareceram como as maiores vítimas dos furtos a transeunte (260,0) e do roubo de veículo (32,71), enquanto os adolescentes de 12 a 17 anos foram as maiores vítimas de estupro (35,43) e de atentado violento ao pudor (10,04).
Por outro lado, é importante notar que, se os jovens são comprovadamente o grupo social mais vitimado pela violência, eles também figuram como seus maiores autores. A violência que se manifesta em atos de delinqüência corriqueiros, no vandalismo contra o espaço público, nos rachas e manobras radicais no trânsito, nas brigas entre gangues rivais, no dia-a-dia do ambiente escolar ou nas agressões intolerantes a homossexuais, negros, mulheres, nordestinos ou índios em várias partes do país é majoritariamente protagonizada por jovens e, em geral, vitima outros jovens. Ou seja, a violência cotidiana que acontece no país hoje é cometida por jovens contra jovens.
O levantamento do MJ supracitado comprova a alta participação de jovens nos crimes que são relatados à polícia. As pessoas com idade entre 18 e 24 anos foram as mais freqüentemente identificadas como infratores por homicídio doloso (17,56 ocorrências por 100 mil habitantes), lesões corporais dolosas (387,74), tentativas de homicídio (22,32), extorsão mediante seqüestro (0,34), roubo a transeunte (218,23), roubo de veículo (20,24), estupro (14,57) e posse e uso de drogas (41,96). Por sua vez, os jovens de 25 e 29 anos apareceram como os principais infratores para o crime de tráfico de drogas (24,47).
Fatores como a expansão, diversificação e sofisticação da violência delitual nas grandes cidades, a disseminação do porte de armas de fogo, a generalização de uma “cultura da violência” e as grandes contradições sociais – especialmente o consumismo exacerbado em meio à restrição das oportunidades de inserção social via mercado de trabalho e às grandes desigualdades sociais – têm sido apontados como responsáveis por este quadro. Estes fatores concorreriam para conformar o cenário em que tanto a criminalidade juvenil quanto a vitimização fatal de jovens vêm crescendo no país. É notório, por exemplo, que à medida que cresce a criminalidade em geral, diminui a idade dos autores da violência delitual. As redes do crime organizado sintetizam esse fenômeno: desde que se estruturaram nos grandes centros urbanos do país a partir da década de 1980, em conexão com o narcotráfico, estas redes criminosas vêm operando por meio de um verdadeiro “exército” de jovens, que tem envolvido a participação crescente de crianças. O lado perverso disso é que o olhar da sociedade sobre
os jovens dos setores populares quase que se restringe ao registro da criminalidade. Nesse sentido, o debate sobre juventude e violência não pode se furtar a analisar, entre outros, a questão do recrutamento de jovens para atividades criminosas e as facilidades ainda vigentes para se obter arma de fogo no país, bem como o processo de educação e formação dos jovens em meio a um contexto de banalização da violência ou mesmo a uma dinâmica férrea da reprodução das desigualdades e da exclusão social.
Entretanto, há que se considerar que, se esses fatores genéricos incidem de maneira especial sobre os jovens, determinando seu maior envolvimento e/ou vitimização pela violência, há algo na condição juvenil que a torna especialmente vulnerável ao seu apelo. Vários estudiosos têm apontado alguns dos aspectos envolvidos na conjugação entre juventude e criminalidade. Em geral, fica evidente que a perspectiva de ganhar dinheiro fácil e rápido com pequenos ou grandes delitos é um aspecto relevante, que pode seduzir alguns jovens pela possibilidade de adquirir os bens de consumo da moda – o passe para uma forma simbólica de inclusão na sociedade mais ampla que contrasta com a exclusão real a que está submetida grande parcela dos jovens brasileiros, especialmente os pobres e negros. No entanto, os estudos indicam também que muitos jovens são atraídos pela perspectiva de obter reconhecimento ao impor medo e insegurança quando ostentam armas de fogo ou de afirmar a sua masculinidade guerreira ao serem identificados como “bandidos”.
Ora, a questão de fundo aqui não difere do que se afirmou anteriormente sobre o engajamento dos jovens em “comportamentos de risco”. No centro do problema está o processo de construção e afirmação de uma nova identidade e o papel que a violência pode exercer nesse contexto. Contudo, deve-se considerar que o envolvimento com a criminalidade e os homicídios de jovens são apenas a expressão extrema da violência que os afeta como autores ou como vítimas, mas não a única e, como se viu, nem sequer a mais comum. As lesões corporais dolosas são o delito pelo qual os jovens são mais freqüentemente identificados como responsáveis nos registros policiais e pelo qual são mais vitimados, conforme os dados do MJ. Isto revela que a presença da violência entre as pessoas desta faixa etária está primordialmente relacionada a eventos como brigas e ameaças – que muitas vezes resultam em mortes ou ferimentos graves – e, portanto, ao seu uso como instrumento de resolução de disputas e conflitos interpessoais.

5.1.6 - Juventude x Juventudes: diversidade e desigualdade
entre os jovens

Se há um componente geracional que permite definir a juventude pelo que há de específico à sua condição, é importante considerar que esta é vivida de forma diversificada e desigual entre os jovens de acordo com suas situações socioeconômicas específicas e com os padrões de discriminação e preconceito vigentes, que repercutem sobre as oportunidades efetivamente disponíveis a cada um. Em outras palavras, a duração e a qualidade desta etapa do ciclo da vida são mais ou menos favorecidas pelas características socioeconômicas dos jovens (a origem social, a renda familiar e o nível de desenvolvimento da região onde vivem) e pelas diferentes exigências relacionadas aos papéis/lugares que homens e mulheres ou indivíduos pertencentes a grupos raciais distintos tradicionalmente ocuparam na sociedade. Por isso, tornou-se usual empregar a expressão “juventudes” para enfatizar que, a despeito de constituírem um grupo etário que partilha várias experiências comuns, subsiste uma pluralidade de situações que confere diversidade às demandas e necessidades dos jovens. Essa pluralidade de situações deriva da combinação das várias dimensões socioeconômicas e se evidencia na análise dos indicadores sociais dos jovens brasileiros. Quanto à renda, por exemplo, 31,3% dos jovens podem ser considerados pobres, pois vivem em famílias com renda domiciliar per capita de até ½ salário mínimo (SM). Apenas 8,6% são oriundos de famílias com renda domiciliar per capita superior a 2 SMs, e cerca de 60,0% pertenceria ao extrato intermediário, com renda domiciliar per capita entre ½ e 2 SMs. Embora haja equilíbrio na distribuição dos jovens brasileiros por sexo (49,5% homens e 50,5% mulheres),43 a pobreza é ligeiramente superior entre as mulheres jovens (53,1%), tal como se dá para a população como um todo. Vale observar que os jovens de baixa renda estão concentrados na região Nordeste (50,8% do total do país), com destaque para o fato de que 20,6% da juventude nordestina é constituída de jovens pobres que vivem em áreas rurais. Note-se, ainda, que os jovens pobres são majoritariamente não-brancos (70,3%), enquanto os jovens brancos são 77,7% dos não-pobres – embora a distribuição dos jovens brasileiros entre os grupos branco e não-branco seja de 47,1% e 52,9%, respectivamente. Depreende-se daí que a faixa de rendimento mensal da família em que vive o jovem mantém estreita relação com a sua origem regional e com sua cor de pele, e que ser um jovem nordestino e não-branco (especialmente negro) no Brasil representa maior probabilidade de ser pobre.
As desigualdades entre jovens brancos e negros (pretos e pardos) se fazem refletir, nos mais diferentes aspectos da vida social, configurando menores oportunidades sociais para a juventude negra. No campo da educação, por exemplo, constata-se que o número de jovens negros analfabetos, na faixa etária de 15 a 29 anos, é quase três vezes maior que o de jovens brancos. A taxa de freqüência líquida (estudantes que freqüentam o nível de ensino adequado à sua idade) dos jovens negros é expressivamente menor que a dos jovens brancos, tanto no ensino médio como no superior. Na faixa de 15 a 17 anos, que corresponde ao período em que se espera que o jovem esteja cursando o ensino médio, os brancos apresentam uma taxa de freqüência líquida de 58,6%, contra 37,6% dos negros. No ensino superior a desigualdade entre jovens brancos e negros se torna ainda maior: na faixa etária de 18 a 24 anos, a taxa de freqüência líquida para os brancos é de 19,6%, enquanto para os pardos é de 6,4% e de 6,3% para os pretos, uma diferença de quase três vezes em favor dos jovens brancos. Pode-se lembrar ainda o fato de que os jovens negros estão sobre-representados no seguimento de jovens que não trabalham e nem estudam, além de sua inserção no mercado de trabalho estar caracterizada por condições de maior precariedade que a dos jovens brancos.
Os jovens negros são, também, as maiores vítimas da violência: enquanto os jovens brancos do sexo masculino apresentam uma taxa média de 145,6 mortos por causas externas para cada grupo de 100 mil habitantes, as taxas dos jovens pretos e dos pardos são, respectivamente, de 228,7 e 221,0. Quando analisadas exclusivamente as mortes por homicídio, a taxa encontrada para os jovens brancos do sexo masculino foi de 69,2 por 100 mil habitantes, ao passo que para os jovens pretos essa taxa foi de 148,8, e para os pardos, 140,9. Considerando-se apenas a faixa etária de 18 a 24 anos, o grupo mais vitimado entre os jovens, a juventude branca do sexo masculino apresenta uma taxa de mortalidade por homicídios de 79,10 para cada grupo de 100 mil habitantes, enquanto para os jovens pretos essa taxa é de 172,56 e para os jovens pardos, de 161,14 – ou seja, para cada jovem branco morto por homicídio morrem, em média, dois jovens negros.
Há grande disparidade também na realidade dos jovens que vivem em áreas urbanas – 84,9% do total, sendo cerca de ¹/³ em áreas metropolitanas e de ²/³ em áreas não-metropolitanas – e daqueles que habitam o campo (15,1%). Por um lado, os jovens urbanos convivem com uma rotina marcada por altas taxas de desemprego, pela violência, pela crescente segregação espacial e pela qualidade de vida deteriorada. Cite-se, por exemplo, o fato de que, do total de jovens urbanos, 33,6% vivem em moradias inadequadas fisicamente. Como reflexo das restrições ao acesso à habitação nas grandes cidades brasileiras, observa-se que cerca de 2 milhões de jovens entre 15 e 29 anos moram em favelas, sendo que a maior parte dessa população é negra (66,7%) e vive em famílias com renda domiciliar per capita de até ½ SM (42,5%). Por outro lado, os jovens das áreas rurais têm de se defrontar com questões muito específicas, como o esforço físico que a atividade agrícola requer, as dificuldades de acesso à terra, as expectativas em relação à reprodução da agricultura familiar e o celibato – contrariamente ao que acontece no meio urbano, as jovens rurais são minoritárias em relação aos homens, especialmente na faixa etária de 18 a 24 anos. Além disso, é notório que a juventude rural está submetida a dificuldades de acesso aos equipamentos
públicos e a condições de vida precárias, concentrando 29,5% dos jovens pobres do país. Evidência das desigualdades em detrimento dos jovens rurais podem ser verificadas no campo educacional: o nível de escolaridade dos jovens rurais é 50% inferior ao dos jovens urbanos, pois subsiste o entendimento de que, para ser agricultor, não é necessário estudar; o analfabetismo atinge 9% dos jovens que vivem no campo, enquanto esta proporção é de 2% para os que vivem em áreas urbanas; a qualidade do ensino rural é pior do que o urbano, padecendo, quase como regra, de instalações, materiais e equipamentos insuficientes e inadequados.
Também é possível identificar situações bastante diversas entre os jovens conforme a condição civil e a posição no domicílio, especialmente no que diz respeito à freqüência à escola e à inserção laboral. Em geral, entre os jovens prevalecem os solteiros, na condição de filhos; no entanto, encontra-se uma significativa proporção de pessoas que já constituiu domicílio próprio, ocupando a posição de chefe de domicílio e/ou de cônjuge – 38,4% do total, sendo que as mulheres estão majoritariamente na condição de cônjuges. Esta proporção varia muito conforme o grupo etário a que pertence o jovem, sendo de 6,2% no grupo de 15 a 17 anos, de 33,1% no grupo de 18 a 24 anos, e chegando aos 67,0% no grupo mais velho, indicando que a maioria expressiva dos jovens nesta última faixa já assumiu as responsabilidades ligadas à provisão do seu próprio domicílio e enfrenta a pressão real de encontrar uma inserção no mercado de trabalho que lhe garanta um rendimento suficiente. Curioso notar, contudo, que, se 84,4% dos jovens de 15 a 17 anos permanece na condição de filho, contando com a solidariedade de sua família de origem e possivelmente experimentando as vivências típicas desta faixa etária, entre aqueles que são chefes de domicílio ou cônjuges 87,6% são mulheres, entre as quais 47,4% pertencentes ao grupo de renda domiciliar per capita inferior a ½ SM. Estes números evidenciam que, a despeito de a inatividade ser alta nesse grupo etário como um todo, existe um grande ônus na constituição de um domicílio para as jovens de 15 a 17 anos, especialmente pela ocupação em atividades domésticas e o cuidado com os filhos. Isto é tanto mais grave quando se considera que 71,2% destas jovens não estudam o que tende a comprometer suas chances futuras no mercado de trabalho.
As desigualdades entre os jovens do sexo masculino e do feminino, de todas as faixas etárias, no que diz respeito à condição de atividade e de estudo, refletem, de um lado, a manutenção dos papéis tradicionais de gênero. Cabe aos homens, por mais jovens que sejam trabalhar para garantir a subsistência da família – daí o fato de procurarem mais cedo o mundo do trabalho ou permanecerem na inatividade (estudando
ou não) quando não são chefes de domicílio. Assim, 27,1% dos jovens de 15 a 17 anos conciliam os estudos com o trabalho e 11,3% só trabalham, enquanto entre as jovens estas proporções são, respectivamente, de 17,5% e 4,9%. As jovens mulheres, por sua vez, apresentam melhores taxas de freqüência escolar líquida, embora ainda tendam a assumir o trabalho doméstico e o cuidado dos filhos quando se casam; com isso, a proporção de jovens mulheres que não estudam nem trabalham é crescente de acordo com a faixa etária, passando de 12,3% entre as jovens de 15 a 17 anos a 31,7% e 32,7% entre aquelas de 18 a 24 e de 25 a 29 anos, respectivamente. De outro lado, percebem-se duas novas tendências contrárias a essa divisão tradicional do trabalho. Em primeiro lugar, há uma proporção cada vez maior de mulheres que não abandonam o mundo do trabalho ou a ele retornam, mesmo depois do casamento e/ou da maternidade – especialmente quando são as únicas provedoras; e, em segundo,
cresce a proporção de jovens homens que, apesar de chefes, não são capazes de manter a família com a renda do trabalho, dependendo, portanto, de benefícios sociais ou de doações de familiares.

5.1.7 – Situação educacional dos jovens brasileiros

A prioridade atribuída à universalização do acesso ao ensino fundamental representou um passo importante na longa trajetória rumo à construção de uma educação de qualidade para todos. No entanto, muito resta a ser feito para transformar as escolas brasileiras em efetivos espaços de ensino e aprendizagem estimulantes para os alunos e garantidores de um percurso educacional completo.
Ao analisar a situação educacional dos jovens brasileiros, evidenciam-se diversas falhas decorrentes, em grande medida, do processo educativo: existência de 1,5 milhão
de analfabetos; persistência de elevada distorção idade-série, o que compromete o acesso ao ensino médio na idade adequada; baixa freqüência ao ensino superior; e restritas oportunidades de acesso à educação profissional. Estes temas são objeto de análise desta seção, que se propõe também a identificar desafios a serem enfrentados para ampliar as oportunidades educacionais deste segmento da população brasileira.
Para tanto, buscou-se compor um quadro-síntese da situação educacional dos jovens brasileiros em 2006, desagregados segundo três grupos etários, conforme a tabela 2.
Pode-se constatar que, na tabela 2, a incidência do analfabetismo é tanto maior quanto mais elevada é a faixa etária dos jovens brasileiros. Outro aspecto a ser ressaltado diz respeito à distorção idade-série, evidenciada pelo fato de quase 34,0% dos jovens de 15 a 17 anos ainda freqüentarem o ensino fundamental. Também merece atenção o fato de pouco menos de ⅓ da faixa etária de 18 a 24 anos freqüentar a escola, e de apenas 12,7% cursarem o ensino superior, considerado o nível de ensino adequado a esta faixa etária. Por fim, a freqüência à escola de jovens entre 25 e 29 anos também se limitava a 13,0% do total, ainda que mais da metade (7,3%) freqüentasse o ensino
superior. Em suma, com o aumento da idade diminui a freqüência de jovens à educação escolar. Contudo, tais desigualdades de acesso revelam conquistas para as novas gerações, na medida em que vem sendo reduzida a incidência de pessoas que se encontram fora da escola e que não concluíram a escolarização obrigatória, quando se compara a faixa etária de 15 a 17 anos com as demais.



Situação dos jovens no Brasil – 2006



    


De acordo com o estudo, o desemprego entre os jovens não é um fenômeno apenas brasileiro, mas global. No entanto, entre os dez países pesquisados, o Brasil é o que apresenta a maior taxa de jovens desempregados, com 46,6%. México vem em seguida com 40,4%, Argentina, 39,6%, Reino Unido, 38,6%, Suécia, 33,3%, Estados Unidos, 33,2%, Itália, 25,9%, Espanha, 25,6%, França, 22,1%, e Alemanha, 16,3%.



      


Nenhum comentário:

Postar um comentário